Pesquisadores do Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (Inca) realizaram o maior estudo de sequenciamento do genoma total de pacientes com câncer de esôfago do tipo carcinoma epidermoide, em oito nações (Brasil, China, Irã, Japão, Quênia, Malaui, Reino Unido e Tanzânia), durante cinco anos.
O estudo, inédito, foi publicado pela revista Nature Genetics e detectou que o álcool deixa marcas físicas, também chamadas assinaturas mutacionais, nas células do esôfago, o que pode ocasionar o tipo mais frequente de câncer no órgão, que é o carcinoma epidermoide.
A pesquisa faz parte do projeto Mutographs, liderado pela Agência Internacional para Pesquisa em Câncer da Organização Mundial da Saúde (IARC/OMS) e pelo Instituto Sanger do Reino Unido, que conta com um grupo de cientistas de dez países, incluindo o Brasil. O Inca representa o Brasil e a América Latina no projeto, com os pesquisadores Sheila Coelho Soares Lima e Luis Felipe Ribeiro Pinto, chefe do Programa de Carcinogênese Molecular e coordenador de pesquisa do instituto.
O estudo teve apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj). Segundo o coordenador Luis Felipe Ribeiro Pinto, existem dois tipos principais de câncer de esôfago. O primeiro deles é o carcinoma epidermoide, responsável por 80% dos tumores e o tipo de câncer de esôfago mais presente no Brasil. Os 20% restantes se referem ao adenocarcinoma, que ocorre em países ricos, como Estados Unidos, Canadá e Inglaterra. Ainda de acordo com o especialista, como o carcinoma epidermoide tem maior prevalência em países em desenvolvimento, não se tem tanto conhecimento sobre ele quanto em relação ao adenocarcinoma que reúne muito mais informações científicas. Segundo o pesquisador do Inca, a ocorrência do carcinoma epidermoide varia muito entre os países, no mundo. Entre os países ocidentais, o Brasil apresenta a maior ocorrência. “Foi o único país, na verdade, nas Américas que teve pacientes incluídos [no estudo]. Os demais foram países asiáticos ou do leste da África”.
Os cientistas já sabiam que os principais fatores de risco, em especial para o carcinoma epidermoide, era o consumo de álcool e de tabaco. O que os pesquisadores desconheciam era como esses produtos levavam ao câncer de esôfago. Resultados O estudo comprovou, através da identificação de marcas genéticas deixadas no genoma do tumor de 552 pacientes, que o álcool provoca mutações no código genético das células do esôfago que levam à ocorrência do câncer.
Segundo a pesquisa, um produto do álcool (composto chamado acetaldeído) provoca mutações do material genético das células do esôfago dessas pessoas. Do total das estruturas genéticas investigadas, 5,4% são de brasileiros pacientes do Inca.
O material coletado incluiu amostras de tecido tumoral e de sangue dos pacientes. De acordo com Luis Felipe Ribeiro Pinto, a observação dessas assinaturas confere uma relação causal entre determinados hábitos ou exposições ambientais e o câncer, reforçando dados epidemiológicos que, em geral, não oferecem provas físicas.
Nos países asiáticos, como China e Japão, álcool e tabaco também são fatores de risco, embora se beba e fume em muito menor proporção do que no mundo ocidental. Mas o principal fator de risco na Ásia são as bebidas quentes, como chás, a exemplo do que ocorre no sul do Brasil, com o chimarrão. Em relação às nações africanas investigadas – Quênia, Malaui e Tanzânia -, quanto mais pobres, menos se conhece sobre as causas da doença. Nesses países, os pacientes tendem a beber leite fermentado quente, que vira um tipo de álcool. O percentual de álcool presente
na bebida dos africanos, entretanto, é baixo. O pesquisador lembrou que, nessas localidades, a pobreza também é um fator de risco que pode se manifestar, inclusive, em outra marca genética identificada no estudo: sinais de envelhecimento precoce. “
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